Um Plano de Vingança - 8. A Carta


Quando acordei permaneci de olhos fechados, tinha a noção que estava novamente na enfermaria mas desta vez não estava sozinha. Ouvia vozes à minha volta e tentei ao máximo concentrar-me nelas, ouvir o que diziam.
- Mas afinal o que se passou Albus? – Ouvia a voz da McGonagall. – O que era tudo aquilo?
- Ela estava com tanto ódio que não conseguia controlar o poder que guarda dentro dela. – Dizia Dumbledore com calma.
- Mas que poder é esse? – Notava-se pela voz de McGonagall que ela estava confusa.
- Eu não sei exactamente que poder é, apenas tenho suposições. Creio que ela consegue controlar o ar à sua volta. – Dumbledore parecia pensativo, talvez tentando perceber o que de facto eu conseguiria fazer.
Eu não estava a perceber aquela conversa e então ouvi uma porta a abrir lentamente e passos virem na minha direcção. Conseguia identificar que era mais do que uma pessoa, três talvez. Depois os passos pararam perto de mim e o silêncio permaneceu durante alguns segundos.
- Como é que ela está professor? – Ouvi a voz preocupada de Daniel. Fiquei feliz por ele estar ali, por ele ainda se preocupar comigo depois de também o ter enganado.
- Continua quieta. Mas talvez já nos possa ouvir.
- Suzane? – Ouvi agora a voz de Harry. – Suzane, consegues ouvir-me?
Eu queria responder mas não conseguia, não tinha forças para tal. Apenas mexi um dedo tentando fazer com que eles percebessem que eu estava a ouvi-los.
- Ela ouviu. – Disse Daniel alegre. – Ela mexeu o dedo, consegue ouvir-nos.
- Ainda bem. – Ouvi Harry aliviado.
Depois começaram a falar comigo, coisas que não faziam muito sentido para mim. Eles falavam de uma tempestade, de um remoinho à minha volta, de um raio que quase acertara em Daniel. Eu continuava sem perceber nada. Afinal o que tinha acontecido? Porque é que eu estava ali deitada, sem forças? Eu queria gritar-lhes, dizer-lhes que não estava a entender, que não me lembrava de nada. Mas não conseguia.
Ouvia sempre a voz de Daniel, do Harry, do Dumbledore e da McGonagall. Mas quem era a outra pessoa que eu sentia ao meu lado mas que não falava? Queria abrir os olhos para ver quem era mas nem para isso tinha forças. E eles continuavam a tagarelar animadamente para mim. Faziam piadas sobre o que tinha acontecido.
- Eu acho que os muggles ficaram confusos com o tempo. Eles deviam prever sol e de repente aparece uma tempestade. – Dizia Daniel a rir e depois todos os outros riam, à excepção da outra pessoa que se encontrava lá e que eu não sabia quem era.
Eu tentava a todo o custo abrir os olhos até que finalmente consegui abri-los um pouco mas foi o suficiente para ver uns olhos azuis, que eu tão bem conhecia, ali ao meu lado a olharem para mim. Tentei abrir mais os olhos mas não consegui tendo de os fechar novamente.
- Draco. – Disse quase sem voz.
Os outros continuavam a tagarelar mas eu percebi que quem eu realmente queria que me ouvisse tinha ouvido pois senti-o pegar na minha mão. Só aquele toque fez-me sentir bem. Depois senti-o acariciar a minha face suavemente e aquilo fez-me sorrir por dentro mas não consegui esboçar qualquer sorriso nos lábios. A partir daí deixei de ouvir as vozes alegres de Daniel e Harry, deixei de sentir o toque suave de Draco e voltei a adormecer.
Quando novamente voltei ao consciente aquela sala estava silenciosa. Desta vez consegui abrir os olhos, mesmo que lentamente, e vi que estava escuro, a única luz que existia vinha de uma vela próxima. Sentia alguém ali ao meu lado e virei-me para ver. Deparei-me com um rapaz loiro com a cabeça apoiada nos braços em cima da cama. Sorri ao perceber quem era. Mexi o braço tentando toca-lo e quando o fiz ele levantou a cabeça assustado e olhando-me fixamente até que um sorriso apareceu nos seus lábios.
- Suzane. – Disse ele a sorrir e abraçando-me. – Finalmente acordaste.
- Finalmente? – Aquela palavra deixou-me confusa.
- Estás assim, nesse estado vegetativo, há três dias.
Aquela informação deixou-me chocada. Como era possível eu estar naquela cama, sem acordar, há três dias? Afinal o que tinha acontecido para eu estar ali?
- Bem… Acho que desta vez não foi por ter partido um copo na mão. – Disse sorrindo.
- Não, desta vez não. – Ele disse sorrindo também.
Ficamos em silêncio por uns segundos e depois ouvi a porta ser aberta e um vulto ir até perto de nós.
- Ela acordou? Já não era sem tempo. – Ouvi a voz de Daniel surpreso. – Então bela adormecida como te sentes?
- Bem. Acho eu. – Disse meia confusa.
- Daniel o que estás a fazer aqui a esta hora? – Perguntou Draco repreensivo.
- O que tem a hora? Lá por serem quatro e meia da manhã não quer dizer que não possa visitar os doentes. – Daniel sorria e logo eu e Draco sorrimos também. – Mas agora que já vi que estás bem vou voltar para a cama. Ao contrário de certas pessoas eu não tenho autorização para perder aulas e ficar aqui o dia e a noite. A propósito Draco acho que precisas de um banho.
- Cala a boca Daniel e vai embora antes que alguém te apanhe. – Disse Draco um pouco irritado.
Vi Daniel sair e só depois aquela informação foi processada pelo meu cérebro que parecia um pouco mais lento que o normal.
- Como assim o dia e a noite? – Eu perguntei confusa e ao mesmo tempo acusadora. – Draco, tu ficaste aqui durante três dias sem nunca sair?
- Sim. E não me arrependo nada. – Sorriu e depois aproximou-se um pouco mais de mim. – E agora que acordaste é que não me arrependo mesmo.
Ele aproximou-se mais ainda de mim e beijou-me com ternura. Por algum motivo que eu não conhecia aquele beijo significou mais do que qualquer outro que ele já me tinha dado. Era como se eu tivesse perdido o Draco e agora ele tivesse voltado para mim e aquele beijo era a prova que ele me amava e que eu também o amava. Ele afastou-se um pouco, terminando o beijo, e sorriu olhando-me nos olhos. E então uma pergunta veio-me à cabeça.
- O que aconteceu? Porque é que eu estou aqui?
- Tu não te lembras? – Ele perguntou semi-serrando os olhos.
- Não. – Disse abanando a cabeça.
- É melhor não falarmos disso agora. Ainda estás fraca.
- Fraca? Draco, eu dormir durante três dias. – Disse sorrindo.
- Mesmo assim. Deixa isso para depois.
Eu não queria deixar para depois, precisava daquela informação mas sabia que não ia conseguir nada dele, pelo menos naquele momento. Então apenas levantei uma mão e acariciei-lhe a face e ele fechou os olhos ao meu toque, o que me fez sorrir. E ficamos a conversar sobre nenhum assunto em particular até cerca das sete horas quando Madame Pomfrey veio até mim para me examinar. Disse que eu ainda teria de ficar ali mais um tempo, pelo menos mais um dia, para observação. Eu não gostei muito da ideia e reclamei com ela mas Draco convenceu-me a ficar.
O dia seguinte passou-se com visitas de Daniel e Harry nos intervalos. Eles continuavam a não se suportar mas já não brigavam à minha frente. Draco teve licença para permanecer mais aquele dia comigo mas teve de ir dormir ao quarto dele. Ele reclamou mas eu e Daniel conseguimos convence-lo a ir.
Quando acordei na manhã seguinte Madame Pomfrey veio de novo observar-me e disse que eu já poderia ir embora. Draco e Daniel vieram ter comigo à enfermaria e descemos juntos, eu e Draco de mãos dadas, até ao Salão Principal. Muitos alunos olhavam para mim quando entrei mas tentei não fazer caso deles. Harry veio ter comigo perguntando-me como estava e dizendo-me que o Dumbledore queria falar comigo depois do jantar. Deu-me um beijo na face e foi sentar-se com os amigos.
Eu, Draco e Daniel conversávamos sobre assuntos banais até que começaram a entrar as corujas com o correio e uma delas pousou à minha frente. Eu fiquei admirada, nunca tinha recebido correio antes. Ia pegar na carta mas quando alcancei a pata da coruja já a carta tinha desaparecido. Eu olhei para o lado e vi Draco com a carta na mão e tanto ele como Daniel olhavam para o envelope, assustados.
- O que se passa? – Perguntei confusa para os dois. – Draco, Dan… O que se passa?
Eles olharam para mim por um momento e depois Draco estendeu a mão com a carta derrotado.
- Não vale a pena esconder mais. Tens recebido esta carta durante os três dias que tiveste na enfermaria. É sempre a mesma porque eu envio para trás, pensava que ele ia desistir mas parece que me enganei.
- Desistir? Draco quem é que me envia essa carta?
- Lê. – Disse entregando-me o envelope.
Eu peguei no envelope e abri-o. No interior estava um pedaço de pergaminho com uma letra fina e elegante que eu não conhecia, então comecei a ler.

Cara Suzane Manson,
Li a notícia que saiu no Profeta Diário sobre ti. Em primeiro lugar quero dar-te os parabéns por teres conseguido aos 14 anos usar as Maldições Imperdoáveis sem problemas e também por teres sido capaz de criar uma Marca Negra, mesmo que falsa. Agora quando a seres uma Animagus… Conseguiste? Ou desististe?
Mas eu não enviei esta carta apenas para te dar os parabéns pelos teus feitos. Devo dizer que foi um pouco insultuoso terem-te comparado comigo. É claro que não posso dizer que não tens potencial, sem dúvida que o tens, talvez até mais potencial do que qualquer um dos meus Devoradores da Morte, mas daí a chegares ao meu nível…
Li também que és prima de Harry Potter e que treinaste tanto para te poderes vingar dos Devoradores que mataram a tua mãe e os pais do Harry. Tudo isso foi realmente uma surpresa para mim. Mas a maneira como usas o filho de Lucius para lhe tirares informações diz muito sobre ti, és capaz de qualquer coisa para conseguires o que queres. Tenho a certeza que estás em Slytherin.
Mas gostaria de te fazer uma proposta. Queres juntar-te a mim? Podes vir a ser mais poderosa do que já és e eu posso ajudar-te a chegar longe, mais longe do que alguma vez possas ter imaginado. Gostaria de uma resposta tua.
Cumprimentos,
Lord Voldemort

Quando terminei de ler a carta fiquei ali, paralisada a olhar para ela. Como assim notícia no jornal? Como é que ele sabia (e se veio no jornal todos os bruxos sabiam) que eu tinha feito aquelas coisas? Olhava de Daniel para Draco confusa.
- Não precisas de responder. – Disse Draco sério a olhar para mim. – Aliás, não vais responder. Não tem cabimento responderes a isso.
- Eu não estou a perceber. Como é que ele sabe estas coisas? Que história é esta da notícia no Profeta Diário? – Eu olhava-o completamente confusa.
- Ela não se lembra de nada? – Perguntou Daniel a Draco que apenas abanou negativamente a cabeça.
- Algum de vocês me pode explicar o que se passou? – Disse começando a irritar-me e vi que um prato começava a flutuar à minha frente sem que ninguém fizesse nada, aquilo era estranho.
- Draco é melhor contar-lhe. – Disse Daniel receoso atrás de mim. – Ela ainda vai partir a louça. - Eu olhei para Daniel com os olhos semi-serrados.
- Suzane é melhor irmos lá para fora. – Disse Draco agarrando-me a mão e puxando-me para fora do Salão.
Fomos até ao jardim com Daniel a seguir-nos. Chegamos perto do lago e o Draco largou-me afastando-se um pouco. Aquilo já me começava a assustar. Então Draco e Daniel começaram a falar, um de cada vez, sobre como a Pansy Parkinson tinha roubado o meu diário e o tinha enviado para Rita Skeeter, uma jornalista do Profeta Diário, e que depois essa jornalista tinha escrito um artigo sobre mim, citando algumas das frase que eu escrevera no diário. De repente a memória voltou. Vi na minha cabeça todos os acontecimentos daquele dia, o olhar furioso de Draco, o que eu tinha feito à Parkinson, o remoinho à minha volta e o beijo do Draco.
Olhei para os dois rapazes à minha frente que sem dúvida esperavam uma reacção minha mas eu apenas conseguia pronunciar uma coisa.
- Porquê?
Eles ficaram a olhar para mim confusos com a minha pergunta mas depois Draco falou, ainda longe de mim.
- Porquê o quê?
- Porque é que não continuas zangado comigo? Porque é que disseste que me perdoavas depois de tudo o que descobriste sobre mim?
- Porque me lembrei da tua música e o Dumbledore contou-me porque agias assim. Percebi que estavas a tentar ser alguém que não eras. – Ele começou a aproximar-se, sem deixar de falar. – Tu não és a rapariga vingativa que pensas ser, tu és uma rapariga carinhosa, divertida… E foi por essa rapariga que eu me apaixonei.
As lágrimas começavam a escorrer-me pelo rosto. Ele tinha razão, eu tentava ser alguém que eu não era. Eu pensava que representava quando estava com as outras pessoas mas a verdade é que eu representava quando estava sozinha e era eu mesma quando estava com Draco e Dan. Eu odiava a pessoa que era quando estava em Durmstrang, aquela rapariga que todos evitavam ser amigos, a rapariga que passava as noites e os fins-de-semana enfiada na biblioteca a estudar. Na realidade eu adorava ser a pessoa que era quando estava com Draco e Dan, a rapariga alegre.
- Obrigada! – Disse apenas num murmúrio devido às lágrimas. – Obrigada aos dois por terem trazido a rapariga alegre que eu era antes de meter na cabeça este estúpido plano de vingança.
- Não tens de agradecer Suzy. – Disse Dan a sorri. – Os amigos são para isso.
Eu sorri e abracei-o. Ele no início ficou um pouco surpreso mas depois abraçou-me também.
- Hey, não faças isto muitas vezes. O Draco é ciumento.
Eu afastei-me dele a sorrir e virei-me para o Draco que nos olhava. Fui até lá e fiquei de frente para ele olhando-o nos olhos. Então ele agarrou-me e beijou-me como se ele precisasse daquilo para viver. E eu precisava mesmo daquilo para viver. Passado um momento ele afastou os seus lábios dos meus e apenas me abraçou.
- Bem… Eu estou aqui a mais. Com licença. – Disse Daniel virando costas e indo para dentro do castelo.
Eu e o Draco apenas ficamos ali, abraçados, sem dizer uma palavra. Não precisávamos de palavras, ambos sabíamos o que estávamos a sentir.

(Continua)

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